Morosidade do Judiciário brasileiro
*Por Mauro Vasni Paroski
Excesso de simplicidade no trato do que é sofisticado não pode produzir bons resultados. Problemas de grandes proporções geralmente têm vários culpados. Muitos não estão dispostos a aceitar sua responsabilidade. Poucos estão habilitados para falar do Judiciário. O público externo, mesmo advogados experientes e membros da OAB, em regra, não reúnem condições ideais para assunto desta magnitude. Quase sempre conhecem somente a parte visível dos problemas. Opiniões equivocadas têm dado o tom (desafinado) das críticas.
A sociedade precisa ser informada que a morosidade do Judiciário não o atinge na mesma extensão e profundidade em todos os seus ramos e graus de jurisdição. Não é possível colar o mesmo rótulo indigno para todos os processos e juízes. A generalização é um pecado imperdoável. Os órgãos judiciários não têm a mesma estrutura e grau de informatização. Enfrentam problemas diferentes em cada ramo e Estado da federação.
O funcionamento do Judiciário é tema complexo. Não admite visões reducionistas e simplistas, meias-verdades ou discurso demagógico. Não é honesto transmitir para a sociedade, como se fosse uma realidade única, homogênea e incontestável, uma mesma visão catastrófica sobre o Judiciário. Não presta homenagem à verdade, afirmar que um processo tem duração de dez anos em primeiro grau de jurisdição. São casos isolados, que constituem exceções. Cada processo judicial tem uma história única, capaz de fornecer explicação sobre seu estágio evolutivo, fundada em fatos provados.
Se é verdade que o sistema judiciário nacional é lento, não menos verdade é que quem faz as leis o quer assim. As leis são o que as classes dominantes querem que sejam. Não fique perplexo, caro leitor. As instituições funcionam de acordo com a vontade e o interesse das elites econômicas e políticas, em todos os lugares e épocas, independentemente do sistema político vigente. Há muito discurso retórico e ideológico para iludir o povo. O Judiciário depende dos poderes Executivo (orçamento) e Legislativo (leis). Juiz não faz leis. Não tem as chaves do cofre. Apenas interpreta e aplica as leis elaboradas pelo Legislativo e sancionadas pelo Executivo.
A autonomia financeira do Judiciário na prática não existe. Esta autonomia, quando muito, permite aos tribunais elaborar seus orçamentos, que podem ou não ser aprovados pelo Legislativo e ratificados pelo Executivo. O sistema recursal brasileiro é irracional. Admite dezenas de recursos num mesmo processo. Quem não tem razão no processo, também não tem interesse em sua rápida tramitação. Quem faz uso ilimitado dos recursos processuais, muitas vezes de forma abusiva, fundamentando sua conduta no surrado – e nem sempre leal – discurso do contraditório e da ampla defesa, são as próprias partes em litígio (para atender seus exclusivos interesses privados, independentemente se são ou não justos). Em regra, são os sempre zelosos e habilidosos advogados dos litigantes que manejam todos os meios recursais disponibilizados pelo sistema processual, enquanto for do interesse dos seus clientes, mesmo que não tenham razão alguma. Almejam o êxito processual.
Distribuir justiça deve ser preocupação dos juízes. Neste enfoque, não é razoável que por meio da OAB (em campanha em defesa do CNJ), venham a público conceder entrevistas à imprensa criticando a morosidade do Judiciário, como se nada tivessem com isso. Devemos aceitar que nem tudo é culpa dos outros. O fardo é muito pesado para um só carregar. Temos esta mania de ficar procurando culpados para justificar o insucesso de nossas escolhas.
A aceitação do fracasso é dolorosa. Quem participa de um processo judicial – partes, juízes e advogados, por exemplo – deve ter a honradez de assumir a parcela de responsabilidade que lhe cabe nos resultados produzidos, incluindo eventual lentidão. Não é aceitável passar para a sociedade a ideia de que os maiores culpados são os juízes. Sejamos honestos e mostremos a realidade tal qual ela é, com seus vícios e virtudes, seus erros e acertos.
* Mauro Vasni Paroski é juiz do Trabalho em Londrina (9ª Região)