Entrevista: Presidente da Amatra IX fala sobre a campanha “Todos contra a Terceirização”
Escolas sem professores, hospitais sem médicos e enfermeiros, construtora sem operários, todos substituídos por funcionários com menos garantias. Com esta reflexão começa o primeiro de uma série de vídeos promovidos pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) e o Movimento Humanos Direitos para combater o Projeto de Lei nº 4.330/2004, que escancara as terceirizações no Brasil.
“Tive a oportunidade de parabenizar pessoalmente o juiz Fabrício Nogueira pela iniciativa, que mostra um poder judiciário cidadão e participativo em questões imprescindíveis para o desenvolvimento da sociedade brasileira”, afirmou o advogado e presidente do Instituto Declatra, Wilson Ramos Filho, conhecido como “Xixo”.
As peças publicitárias produzidas para a campanha trazem Dira Paes, Wagner Moura, Bete Mendes, Osmar Prado e outros artistas que encamparam o projeto. Eles explicam de forma didática e direta as principais consequências do projeto. “A proposta traz benefícios apenas para os empresários que usarão a mão de obra com custo baixo. Basta lembrar que os maiores índices de acidentes de trabalho que hoje ocorrem no Brasil atingem os trabalhadores terceirizados”, alertam os atores.
O Instituto de Defesa da Classe Trabalhadora (Declatra), ouviu com exclusividade o diretor de Assuntos Legislativos da Anamatra e presidente da AMATRA IX, juiz Fabrício Nogueira, na qual ele avalia as consequências do projeto, como surgiu a ideia da produção desta campanha e o papel da Justiça na defesa dos Trabalhadores.
1 – Como surgiu a ideia da produção desta campanha?
A Anamatra acompanha a tramitação do Projeto de Lei nº 4.330/2004, de autoria do deputado Sandro Mabel (PMDB–GO), desde 2004, quando foi apresentado na Câmara. A proposta, que pretende regulamentar a terceirização no Brasil, é na verdade uma tentativa de desmonte radical dos direitos básicos dos trabalhadores consagrados na Constituição Federal e na vasta legislação social que as lutas sociais produziram nos últimos cem anos.
A campanha surge neste momento mais crítico, em que a matéria aguarda deliberação da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, inclusive sob o risco de ser votada diretamente em Plenário, justamente como uma forma de intensificar o nosso posicionamento contrário à proposta. O objetivo é sensibilizar os parlamentares sobre a questão e buscar o apoio necessário para completa rejeição do PL, como forma de preservar a Constituição e o manto de proteção social representado pela legislação trabalhista.
Entre as iniciativas da Anamatra para tentar barrar a tramitação do projeto destacam-se diversas reuniões com parlamentares, participação em audiências públicas e entrega de notas técnicas, assim como fizeram os juízes do trabalho do Rio Grande do Sul e do Paraná em moções unânimes dirigidas aos deputados federais.
Mais recentemente, o Movimento Humanos Direitos (MHuD) uniu-se à luta da entidade. Diversos atores que participam do movimento, entre eles Camila Pitanga, Osmar Prado e Wagner Moura, gravaram vídeos contra a proposta. O material já está circulando pela internet, nas redes sociais. (Veja aqui)
2 – Esta campanha é um exemplo de que o Poder Judiciário pode envolver-se em campanhas que, de fato, solidifiquem as instituições do estado democrático e que por vezes até extrapolem as rotinas de trabalho?
Sem dúvida. A Anamatra é comprometida com a efetivação dos direitos humanos e apresenta inúmeras iniciativas de cidadania, com o intuito de ampliar o interesse para temas relacionados aos direitos sociais, disseminar informações e proporcionar integração comunitária. O maior exemplo de inserção social é o Programa Trabalho, Justiça e Cidadania (TJC), que já ultrapassa a marca de 80 mil beneficiados a partir de trabalho voluntário de juízes do Trabalho de todas as regiões do País.
Outra ação que merece destaque é o lançamento da Cartilha do Trabalho Seguro e Saudável. Com tiragem inicial de 70 mil exemplares, a publicação é um marco no conjunto de materiais didáticos sobre os direitos dos trabalhadores.
Os juízes do Trabalho também participam ativamente de iniciativas destinadas à erradicação do trabalho escravo e do trabalho infantil, e à extinção de todas as formas de discriminação presentes no universo do trabalho.
3 – Como o Sr. imagina o Brasil daqui 10 anos caso o projeto seja aprovado?
Sob o ponto de vista do futuro da nação, a terceirização é um retrocesso sem precedentes. O Brasil tem hoje cerca de 43 milhões de pessoas empregadas. Deste total, mais de 11 milhões são terceirizados. Ou seja, um quarto de toda a mão de obra, sem contabilizar os que estão na informalidade, já enfrenta um regime precário no que diz respeito aos seus direitos trabalhistas.
Pesquisa realizada pela Federação Única dos Petroleiros apontou que 98% dos empresários optam pela terceirização para reduzir custos. Apenas 2% excluem a possibilidade de terceirização pela necessidade de contratação de mão de obra especializada. Esses dados, no mínimo, são alarmantes num país em que a criação de postos de trabalho está no centro das ações do Governo e que a geração de emprego é vital para futuras gerações.
Entre as preocupações com o PL 4330/2004 está a liberação geral da terceirização, inclusive na atividade-fim e a permissão da subcontratação em cadeia. A Anamatra entende que a regulamentação da terceirização nos moldes propostos vai significar o aumento desenfreado dessa forma de contratação, a migração de empregados diretos para a terceirização e, consequentemente, uma drástica redução da massa salarial no período.
Também é preocupante a falta de isonomia de salários e de condições de trabalho entre empregado direto e o terceirizado, o que corrobora para a tese de que o projeto segue uma lógica mercantilista e de estímulo à terceirização de forma irresponsável e sem freios.
Clique aqui para conferir o canal da Anamatra no youtube.