29 de junho de 2022

Café Filosófico do TRT-PR discute efeitos da organização do trabalho sobre magistrados e servidores

Com o apoio da Amatra IX, no dia 24 de junho, o TRT do Paraná promoveu Café Filosófico e Lançamento do livro “Justiça em Corpos- Pesquisas em Psicodinâmica do Trabalho no Poder Judiciário”. A obra busca compreender os processos de adoecimento entre magistrados(as) e servidores(as) e a relação entre a saúde e os modelos de gestão e avaliação quantitativos aplicados ao trabalho no Poder Judiciário. O evento contou com a presença do presidente da Associação, juiz Felipe Augusto de Magalhães Calvet.,

O evento contou com a participação dos quatro coordenadores da pesquisa que integra o livro, realizada no âmbito do TRT-PR: o juiz Leonardo Vieira Wandelli, que é coordenador regional da 1ª Coordenadoria da Amatra IX, o médico ergonomista Laerte Idal Sznelwar e as servidoras Luciana Nunes da Motta Tavares e Thais Almeida.

Ao abrir o evento, a presidente do TRT-PR, desembargadora Ana Carolina Zaina, declarou que o livro provoca reflexões sobre felicidade e decisões tomadas. “A obra que conheceremos hoje investiga o sofrimento físico e psíquico gerado em nosso próprio trabalho e as decisões que o potencializam. Entendemos que tudo são escolhas, portanto, tudo pode ser diferente”, declarou.

Para o médico Laerte Idal Sznelwar, o trabalho não é neutro, pois sempre modifica tanto o meio quanto o próprio trabalhador. Portanto, tudo depende do sentido e do direcionamento que se dá às atividades laborais e de como isso é percebido por quem trabalha. “O título do livro em si é uma provocação a um modelo de gestão fundamentado em quantidades, pois a ‘Justiça em Números’ é vivida em corpos”, declarou.

Segundo o médico, existe uma dissociação entre o sentido de promover a paz social fazendo justiça e a gestão organizacional baseada na avaliação do trabalho judicial por números, que observa apenas a quantidade. Laerte Idal Sznelwar afirmou que isto provoca sofrimento físico e mental em magistrados e servidores, que se “coisificam” quando passam a trabalhar em função de números, e não do sentido verdadeiro da própria instituição.

Apesar das críticas aos modelos de gestão quantitativos, todos os palestrantes ressaltaram que os números são essenciais para melhorar

A Pesquisa

A pesquisa que deu origem ao livro foi o tema da fala da psicóloga e servidora Luciana Nunes da Motta Tavares. Ela contou que o grupo de pesquisadores foi formado na Escola Judicial do TRT-PR, por pessoas da área da Saúde e do Direito. Além disso, as investigações foram realizadas de forma qualitativa entre 2014 e 2015, envolvendo magistrados e servidores da Capital e interior, das áreas judiciárias e administrativas do TRT-PR e de 1º e 2º grau de jurisdição.

As pesquisas foram analisadas sob a ótica da Psicodinâmica do Trabalho, ramo da ciência desenvolvido pelo psicanalista francês Cristophe Dejours na década de 1980. Esta abordagem se propõe a analisar a forma com que o trabalhador lida com o sofrimento gerado pela própria organização do trabalho. “Foi uma escolha dos pesquisadores realizar uma investigação qualitativa, por meio de entrevistas individuais e grupos focais, como forma de ouvir a singularidade de cada um”, afirmou.

Magistrados e Servidores

Juiz Leonardo Wandelli

O juiz Leonardo Vieira Wandelli,  titular da 5ª Vara do Trabalho de São José dos Pinhais, e a servidora Thais de Almeida trataram respectivamente da situação de magistrados e servidores. A partir de suas apresentações, foi possível perceber o quanto o Poder Judiciário é heterogêneo não apenas nas atividades realizadas, mas na própria percepção que os seus trabalhadores têm daquilo que fazem diariamente.

O magistrado destacou que a função de um juiz não é julgar processos; julgar é apenas um dos meios para se atingirem os fins da Justiça, que dizem respeito à solução de conflitos. “Quando somos levados a romper com o sentido coletivo e individual do trabalho, trair os valores da profissão que tanto nos custou a adquirir, isso nos traz esse sofrimento ético. Um magistrado antigo que participou da pesquisa falou algo que sintetiza essa perda de sentido quando disse que ‘deixou de ser juiz quando passou a priorizar a quantidade sobre a qualidade’”, comentou.

Em sua fala, a servidora Thais destacou que, enquanto magistrados têm uma vivência mais direta do sentido do próprio trabalho, os servidores constroem este sentido de forma fragmentada e indireta. Portanto, o risco de o trabalho produzir alienação é alto. “Para os servidores ouvidos na pesquisa, o sentido do trabalho está na confiança do papel da instituição para o jurisdicionado, para a sociedade. Quando não se percebe mais este efeito do próprio trabalho na sociedade, o sentido se perde”, destacou.

Com informações da Ascom TRT-PR